1) O que é BIM (e o que não é)
- BIM é um processo colaborativo orientado a dados, sustentado por modelos 3D inteligentes e padrões de informação, ao longo de todo o ciclo de vida da edificação (planejamento, projeto, obra, operação).
- Não é apenas “fazer 3D” nem “um software”. É método + padrões + pessoas + tecnologia + contratos.
- Chave do valor: informação estruturada e interoperável (ex.: IFC/BCF), que habilita análise, coordenação, orçamentação e operação.
Diferença essencial versus CAD: CAD descreve “linhas e layers”. BIM descreve “componentes e propriedades” (pilares, lajes, concretos com fck, classes de agressividade, códigos SINAPI, códigos de montagem, datas de execução, custos).
2) Benefícios tangíveis para projetos estruturais e diagnósticos
- Coordenação e interferências: redução de 50%–90% em retrabalhos típicos (ex.: furo de tubulação em viga detectado na coordenação).
- Quantitativos automáticos (QTO): extração direta por categoria (concreto, formas, aço, blocos), com filtros por pavimento/eixo, integrável ao orçamento 5D.
- Planejamento 4D: simulação de montagem (ex.: sequência de protensão, etapas de escoramento/desforma) para mitigar risco de patologia.
- Verificação de desempenho: checagens de requisitos (ex.: NBR 15575 – desempenho, cobrimentos NBR 6118, cargas NBR 6120) via regras ou revisões sistemáticas.
- Diagnóstico e manutenção: Scan-to-BIM e nuvem de pontos para as built preciso; gestão de anomalias conforme NBR 16747 (inspeção predial); rastreabilidade de laudos.
- Comunicação: relatórios visualmente claros para cliente, obra e fiscalização.
Exemplo rápido (casa 150 m²): coordenação detecta conflito shaft x viga antes da obra, muda-se posicionamento e bitolas. Economia de R$ 3–6 mil entre retrabalho, atraso e desperdício.
3) Padrões e normas (ISO 19650 no Brasil, IFC, ABNT)
- ABNT NBR ISO 19650 (Partes 1 e 2): gestão da informação em BIM, baseada na ISO 19650. Define conceitos como EIR (Requisitos de Informação do Contratante), BEP (Plano de Execução BIM), fases de entrega de informação, papéis e CDE.
- IFC (Industry Foundation Classes): formato aberto para interoperabilidade (openBIM), preferencial para troca entre softwares de disciplinas (Arquitetura/MEP/Estruturas/Orçamento).
- BCF (BIM Collaboration Format): troca de issues (clashes, pendências) entre ferramentas de coordenação e modelagem.
- ABNT NBR 15965 (classificação da informação da construção): útil para organizar bibliotecas/elementos e vincular a composições (apoia o 5D).
– Outras normas que dialogam com BIM no escopo estrutural e de desempenho:
– NBR 6118 (estruturas de concreto), NBR 6120 (cargas), NBR 6123 (vento), NBR 8800 (aço), NBR 15575 (desempenho de edificações), NBR 16747 (inspeção predial).
Dica: adote naming e codificação consistentes (projeto, disciplina, nível, zona) alinhados à ISO 19650 e uma estrutura de classificação (ex.: ABNT 15965 ou Uniclass) desde o dia 1.
4) Fluxo BIM em 8 etapas (aplicável a projetos de casas e obras maiores)
- EIR (Employer’s Information Requirements): o que o cliente precisa? LOD/LOIN, entregáveis, usos (4D/5D/As built), formato (IFC), datas, métricas.
- BEP (Plano de Execução BIM): como a equipe vai entregar (softwares, templates, CDE, responsabilidades, cronograma de trocas IFC/BCF).
- Mobilização: criação de templates, bibliotecas, parâmetros, convenções de nome, matriz de responsabilidades.
- Modelagem disciplinar: arquitetura, estruturas e MEP com marcos de coordenação (LOD/LOIN definidos por estágio).
- Coordenação/clash detection: reuniões periódicas, registro de issues via BCF, prazos e responsáveis.
- Extração de quantitativos e 5D: QTO por disciplina vinculado a composições (SINAPI ou base própria) e revisões de orçamento.
- 4D/Planejamento: vincular pacotes à EAP/WBS e simular sequência executiva.
- Entrega/As built/Digital Twin: consolidar modelos, anexar manuais/garantias, georreferenciar ativos, preparar dossiê de operação/manutenção.
5) Níveis de desenvolvimento: LOD e LOIN sem mistério
- LOD (Level of Development) usual: 100 conceitual, 200 esquemático, 300 detalhado para coordenação, 350/400 detalhamento executivo/fabricação, 500 as built.
- LOIN (Level of Information Need): define a informação mínima por elemento para um uso específico (mais alinhado à ISO 19650).
– Recomendações para casas e pequenos edifícios:
– Estudo preliminar: LOD 200 arquitetura, LOD 200-300 estrutura (volumétrico e principais peças).
- Projeto executivo/compatibilização: LOD 300 arquitetura/estrutura/MEP, com parâmetros suficientes para QTO e 5D.
- As built: pelo menos LOD 400 para elementos críticos (estruturais, shafts, prumadas), com revisões de campo.
6) 4D, 5D e CDE: onde o BIM “paga a conta”
- 4D (tempo): vincular tarefas (EAP/WBS) a elementos. Benefícios: simular escoramento, sequenciar concretagens, evitar conflitos de frentes de serviço, prever logística.
- 5D (custo): QTO automático por filtros (pavimento/zona/andar), vinculado a composições (SINAPI/Tabelas internas). Atualização dinâmica quando o modelo muda.
- CDE (Common Data Environment): ambiente comum de dados para versões, issues, aprovações e rastreabilidade. Reduz “arquivos perdidos”, decisões em WhatsApp e erros de versão.
7) Ferramentas recomendadas (exemplos por uso)
– Autorias e estruturas:
– Revit (arquitetura/MEP/estrutura), Archicad (arquitetura), Tekla Structures (aço/concreto), TQS e Eberick (dimensionamento concreto armado no Brasil), AltoQi (hidrossanitário/MEP).
– Análise estrutural:
– ETABS, SAP2000, Robot, TQS (integração com análise e detalhamento), CypeCAD. Integração via IFC/links nativos.
– Coordenação/4D/5D:
– Navisworks Manage (clash, 4D), Solibri (regras/checagem), BIMcollab/Zutano para gestão de issues BCF, Synchro (4D), ACC/CostX/CostOS/Vico (5D/QTO).
– CDE:
– Autodesk Construction Cloud (ACC/BIM 360), Trimble Connect, Dalux, Bentley ProjectWise.
– Diagnóstico/Scan-to-BIM:
– Nuvem de pontos: Leica Cyclone, Faro Scene, Autodesk ReCap; reconstrução: RealityCapture, Pix4D.
- “Scan-to-BIM”: EdgeWise, Verity, Pointfuse.
- FM/DT: IBM Maximo, Archibus, Planon, EcoDomus, ou soluções baseadas em ACC/Dalux.
Não existe “pilha perfeita”. O critério principal é: interoperabilidade (IFC/BCF), disponibilidade local de mão de obra e custo total de assinatura/treinamento.
8) Integração para estruturas: do modelo ao detalhamento
- Modelagem paramétrica: pilares, vigas, lajes, blocos, sapatas, com propriedades (fck, classe de agressividade, cobrimento, aço CA-50, diâmetros).
- Regras de verificação: checklists para cobrimentos NBR 6118, espaçamentos de armadura, sobreposições, aberturas em laje, furações com reserva.
– Interface análise x modelagem:
– Exportar modelo físico para modelo analítico (barras/cascas). Checar alinhamentos, releases, rigidez de diafragma.
- Round-trip com TQS/ETABS/SAP para atualização coerente.
- Detalhamento: geração de pranchas e listas de aço a partir do modelo, com filtros por pavimento e por sequência de obra.
- QTO confiável: volume de concreto, formas por face, peso de aço por bitola, taxa kg/m³ — pronto para 5D.
9) Diagnóstico e Digital Twin
- As built confiável: leve a nuvem de pontos (laser/drones) ao modelo, compare desvios, atualize elementos com dimensões reais.
- Inventário de anomalias (NBR 16747): cada ocorrência como “issue” georreferenciada no modelo, com severidade, causa provável, foto e ação recomendada.
- Manutenção programada: vincule ativos (telhado, impermeabilizações, esquadrias) com prazos de inspeção e garantia; gere planos de O&M.
- Gêmeo digital (Digital Twin) “lite”: conecte medidores/IoT (temperatura/umidade/energia) ao modelo para análises simples de conforto e consumo.
10) Erros comuns (e como evitar)
- Tratar BIM como “3D bonito”: defina usos concretos (4D, 5D, QTO, coordenação, as built) no EIR/BEP.
- Não ter CDE: sem ambiente comum, perde-se controle de versões e aprovações.
- Ignorar IFC/BCF: sem openBIM, você fica preso a um ecossistema e perde integração.
- LOD exagerado cedo demais: aumenta esforço sem retorno. Use LOIN e entregue o suficiente no momento certo.
- Bibliotecas sem padrão: famílias inconsistentes = quantitativos errados. Padronize parâmetros e classificação (ABNT 15965).
- Sem rotina de coordenação: clash detection tem que ser periódico e com responsáveis e prazos.
11) Plano de implantação em 90 dias (para escritório enxuto)
- Semana 1–2: Estratégia
- Definir usos BIM, EIR/BEP “mínimo viável”, convenções de nome, codificação (disciplina-nível-zona), LOIN por fase.
- Escolher CDE e ferramentas principais. Selecionar 1 projeto piloto (ex.: casa 120–180 m²).
- Semana 3–4: Templates e bibliotecas
- Criar template de projeto (view templates, filtros por fase, carimbos).
- Montar biblioteca de elementos estruturais e MEP com parâmetros de QTO e códigos (ex.: SINAPI).
- Semana 5–8: Piloto e coordenação
- Modelar arquitetura/estrutura/MEP até LOD 300.
- Rodar coordenação quinzenal (clashes críticos).
- Estruturar QTO e 5D com composições padrão.
- Semana 9–10: 4D e entrega
- Vincular WBS e simular sequência crítica (fundação, escoramento, concretagens).
- Preparar entregáveis: pranchas, IFC, BCF, relatório de coordenação, planilha 5D.
- Semana 11–12: Retro e padronização
- Post-mortem do piloto: o que medir, o que repetir, o que cortar.
- Ajustar templates/biblioteca. Formalizar “BEP do escritório”.
Recursos necessários: 1 responsável BIM (coordenador), 1 modelador por disciplina, 2–4h/semana para reuniões e controle de issues.
12) KPIs e ROI que importam para você
- Redução de interferências na obra (% e valor).
- Acurácia de quantitativos vs. compra real (±%).
- RFI/Pendências por mês e tempo de fechamento.
- Horas de retrabalho por disciplina.
- Aderência a cronograma 4D (% marcos cumpridos).
- Variação orçamento 5D vs. custo final.
- Tempo de geração de pranchas e revisões.
Benchmark interno: em 3–6 meses, é comum ver 10–20% menos retrabalho e 1–3% de economia direta de materiais, além de ganho comercial (propostas mais profissionais).
13) Materiais prontos para você usar com leads
Posso te entregar, aqui no chat, modelos editáveis para você adaptar:
– Modelo de EIR e BEP “enxutos” para obras residenciais.
- Checklist de coordenação (estruturas x MEP) focado em casas e pequenos edifícios.
- Planilha de QTO 5D com categorias (concreto, formas, aço, alvenaria, revestimentos) já com campos para códigos SINAPI.
- Roteiro de 4D para obras residenciais (atividades padrão e vínculos a elementos).
- Template de relatório de diagnóstico/inspeção com referência à NBR 16747 (com campos para fotos, severidade, causa provável e ações).